Discurso do Presidente da República Portuguesa no Banquete oferecido em sua honra pela Presidente da República da Finlândia

Helsínquia
09 de Outubro de 2002


Senhora Presidente
Excelências
Minhas Senhoras e meus Senhores

Constitui para mim uma grande honra e um grato prazer ser o primeiro Chefe de Estado português a visitar oficialmente o vosso país. Agradeço, reconhecido, a Vossa Excelência as calorosas palavras de boas vindas que acabou de proferir e as tocantes marcas de simpatia e amizade com que me tem distinguido.

A eleição de Vossa Excelência como Presidente da República — a primeira mulher a ocupar este cargo na história da Finlândia — coroou uma longa carreira dedicada a servir os seus compatriotas e a nação finlandesa, primeiro no movimento estudantil e sindical e depois na vida política, onde ocupou os mais variados cargos, no plano municipal, no parlamento e no Governo. No desempenho destes cargos, sempre Vossa Excelência se distinguiu pelo calor humano com que aborda todas as questões, pela isenção, equílibrio e bom senso com que as analisa e pela simplicidade e sentido prático que emprega para as resolver. Vossa Excelência conquistou assim a confiança, a admiração e a simpatia dos seus compatriotas e de todos aqueles que consigo lidaram, na Europa e no mundo, quando ocupou o cargo de Ministro dos Negócios Estrangeiros. Queira pois aceitar, nesta ocasião, a minha homenagem e testemunho de sincera estima.

A Finlândia é um país amigo, um parceiro e um aliado na União Europeia, uma nação de sólidos princípios políticos e morais, com um profundo apego aos valores da democracia e dos direitos humanos, um exemplo de sucesso do modelo de desenvolvimento europeu, dispondo de uma economia moderna e virada para a alta tecnologia. É um país que inspira respeito, curiosidade e admiração, com o qual Portugal deseja ter relações estreitas e privilegiadas.

Quero, com esta visita, contribuir para que os portugueses descubram um pouco da Finlândia e dar-vos a conhecer melhor aquilo que Portugal tem para oferecer: não apenas as praias e os campos de golfe que tantos finlandeses já conhecem, mas também as empresas de alta tecnologia, a qualidade e a variedade dos nossos produtos, a riqueza da nossa língua e património literário e artístico.

Apesar de distantes, temos vários pontos de afinidade no plano bilateral que desejo valorizar. Somos ambos pequenas economias abertas, cuja prosperidade depende do exterior. As nossas relações são próximas desde o início dos anos 60, fruto da adesão de ambos os países à EFTA. O intervalo de cerca de uma década entre as adesões de Portugal e da Finlândia à União Europeia abrandou o ritmo de desenvolvimento dos nossos contactos. Agora que partilhamos a mesma moeda e o mesmo mercado, estão reunidas todas as condições para aumentar as trocas comerciais e os investimentos recíprocos, tirando partido do elevado grau de complementaridade entre os tecidos económicos dos dois países. Por isso, a comitiva que me acompanha inclui um leque representativo de empresários portugueses, oriundos de variadas áreas que vão desde o turismo às telecomunicações.

Também na área cultural, beneficiaremos em nos conhecer melhor. É meu objectivo permanente aumentar o conhecimento da língua portuguesa, falada no mundo por mais de duzentos milhões de pessoas, e do vasto património literário da cultura lusófona. Entregarei amanhã à Universidade de Helsínquia uma biblioteca de clássicos portugueses, esperando assim estimular e alargar o interesse que tem suscitado a publicação, em finlandês, de obras de autores como Fernando Pessoa ou José Saramago.

Terei também ocasião de inaugurar uma exposição de design contemporâneo português, procurando assim mostrar, na pátria de Alvar Aalto, algo do que se faz em Portugal nesta área. Sei que está programada, para o próximo ano, uma mostra de design finlandês em Portugal. Estão igualmente em curso noutras áreas, como o cinema, ou a música, iniciativas que ajudarão por certo os nossos povos a aprofundarem o seu conhecimento recíproco.

No âmbito da União Europeia, os nossos pontos de vista são muito próximos, designadamente no tocante ao processo de reforma institucional. Partilhamos a preocupação central de resguardar o princípio da igualdade entre os Estados. Acreditamos no método comunitário para promover a integração e ambos queremos uma Comissão forte. Somos favoráveis à incorporação nos tratados da Carta dos Direitos Fundamentais e ambos desejamos que, da próxima revisão dos tratados, possa emergir um documento de carácter constitucional.

A Finlândia e Portugal são, desde a primeira hora, apoiantes firmes do alargamento. Será um momento histórico para a Europa, representando a reunificação do nosso continente, em torno de valores partilhados e de um projecto comum. Consideramos esta reunificação um passo decisivo para fortalecer a estabilidade da Europa e aumentar a sua influência no mundo. Creio que é também uma oportunidade excepcional de relançar o crescimento económico na Europa, reafirmando os valores da coesão económica e social que, agora mais do que nunca, devem permanecer um objectivo central da União.

A União Europeia, mesmo alargada a todos os Estados com o estatuto de candidatos à adesão, não abarcará a Europa toda. A nossa prioridade, no plano externo, deverá continuar a ser a consolidação em todo o continente do estado de direito, com regimes democráticos estáveis dotados de economias de mercado e de um sistema de justiça eficaz, que combata o crime sem pôr em causa os direitos humanos. Penso, em primeiro lugar, na Rússia, mas não esqueço igualmente a Ucrânia e os Estados da ex-Jugoslávia, cujo processo de transição se apresenta ainda semeado de dificuldades.
No plano mundial, defendemos ambos os valores da paz, o respeito pelo direito internacional, a defesa dos direitos humanos. Consideramos que as Nações Unidas devem desempenhar um papel central na resolução das crises internacionais.

Acreditamos que só pela via multilateral poderemos encontrar uma via de progresso para o mundo. A Comunidade Internacional necessita de encontrar formas mais eficazes de governação da globalização, de modo a reduzir a pobreza, preservar o ambiente, combater a doença e lutar contra o crime. Creio que a União Europeia tem um papel central a desempenhar nestas matérias.

A Finlândia e Portugal empenham-se também na cooperação bilateral com outros países mais pobres e vulneráveis. Portugal tem, naturalmente, relações privilegiadas de cooperação com os países de língua portuguesa, a quem está ligado por séculos de história comum. Por isso, estamos particularmente satisfeitos com a decisão da Finlândia de eleger Moçambique, país que Vossa Excelência ainda há pouco visitou, como um dos seus parceiros privilegiados nesta área. Não esquecemos, também, o apoio indefectível dado pela Finlândia, na qual Vossa Excelência tomou parte activa e empenhada, à causa timorense, que podemos com justiça invocar como um triunfo da comunidade internacional sobre a opressão e a injustiça.

Tudo isto nos aproxima, consolida a nossa amizade e abre novas perspectivas de cooperação. Estão pois lançadas as bases de uma relação sã, profícua e duradoura entre a Finlândia e Portugal. Resta-nos agora continuar a construir sobre essas bases. É esse o meu desejo e o propósito que me traz aqui. Mais uma vez, muito obrigado, Senhora Presidente e cara amiga, pelo convite em boa hora formulado para a realização desta visita e permita-me, para terminar, que brinde à sua saúde, à prosperidade do povo finlandês e ao futuro da amizade luso-finlandesa!