Alocução de SEXA PR por ocasião da Imposição das Insígnias da Grã Cruz da Ordem Militar da Torre e Espada a SEXA o Presidente da República Federativa do Brasil, Prof. Doutor Fernando Henrique Cardoso

Palácio Nacional da Ajuda
11 de Novembro de 2002


Senhor Presidente,

É com grande emoção, partilhada por todos os amigos de Vossa Excelência aqui presentes, que o acolhemos em Portugal pela última vez como Chefe de Estado do Brasil, nosso país irmão.

Estes últimos oito anos, que correspondem aos dois mandatos presidenciais de Vossa Excelência representam — digo-o com inteira justiça — um importante virar de página na história do Brasil e traduziram-se também numa decisiva modernização dos laços históricos que unem portugueses e brasileiros. É o grande contributo de Vossa Excelência para esta mudança qualitativa e, quero crer, irreversível que hoje pretendo, em nome do povo português, homenagear.

Tive o privilégio de o conhecer estava Vossa Excelência no exílio. Desde então, acompanhei sempre, com admiração, o seu exemplar percurso político, na luta pela democracia, pelo desenvolvimento e pelo respeito dos Direitos Humanos, primeiro na oposição à ditadura, depois na criação da democracia brasileira, em seguida no Governo e por fim como Presidente da República. Lançando um olhar retrospectivo sobre as décadas que o nosso relacionamento atravessou — e que o transformaram em sólida amizade — é caso para dizer: quanto caminho percorrido desde então! Hoje o Brasil é uma democracia, a sua voz é escutada e respeitada no plano internacional, e, apesar de todas as dificuldades, o seu povo trilha o caminho do desenvolvimento e do progresso económico e social. O mesmo, felizmente, podemos dizer de Portugal. Nestes tempos por vezes dificeis que atravessamos, dá alento e confiança no futuro recordar o trajecto percorrido pelos nossos dois países e os obstáculos que tiveram de ultrapassar para chegarem onde estão hoje.

A determinação, a integridade e a coerência intelectual que sempre pautaram a actuação de Vossa Excelência, constituem linhas de força de uma vida singular, norteada pelo desejo de bem servir o Brasil e o seu povo. Foram tantos e tão variados os seus contributos, quer no plano académico quer no plano político, que não é fácil destacar os mais significativos. Permitam-me, todavia, que refira três áreas em que a acção de Vossa Excelência se revelou decisiva. Em primeiro lugar, menciono a consolidação da democracia no Brasil, objectivo central de uma vida de estudo e de intervenção cívica que culminou na forma como Vossa Excelência exerceu o alto cargo de Presidente da República. Em segundo lugar, menciono o processo de desenvolvimento económico e social do Brasil, objecto central da sua brilhante carreira académica e que, como político, soube incentivar, com rara coragem e lucidez, desde logo, através do já histórico "Plano Real". Em terceiro lugar, menciono, porque nos toca particularmente, o seu contributo para o desenvolvimento das relações entre o Brasil e Portugal e para a consolidação de uma verdadeira comunidade lusófona.

O estímulo e o constante apoio de Vossa Excelência foram decisivos no extraordinário processo de renovação que marcou, na última década, o relacionamento bilateral luso-brasileiro. Durante este período, foram marcos desse novo relacionamento a criação da Comunidades dos Países de Língua Portuguesa, a institucionalização das cimeiras luso-brasileiras, o Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta, e expressão da sua vitalidade o extraordinário desenvolvimento das nossas relações económicas e culturais. Hoje esse relacionamento é adulto, estável e intenso, alimenta-se de valores partilhados e interesses recíprocos e assenta numa confiança mútua que se sobrepõe a quaisquer vicissitudes conjunturais. E, embora não esquecendo o passado, é também moderno, apostando sobretudo no dinamismo das trocas culturais e económicas e nas virtualidades específicas dos dois países.

Muitos dos que hoje aqui estão hoje presentes deram igualmente contributos decisivos para o estimulante processo de valorização e redescoberta de uma relação que, a pouco e pouco, soçobrava sob o peso da História, conferindo-lhe motivações e uma dinâmica inteiramente novas. Estou seguro de que todos reconhecem em Vossa Excelência um obreiro incansável na construção desta nova realidade, de que, portugueses e brasileiros, tanto beneficiam. Daí também o nosso muito sincero "muito obrigado".

Senhor Presidente
Meu Caro e Excelente Amigo

Hoje o Brasil é um Estado moderno, tolerante, genuinamente democrático. A elevação com que decorreu a recente campanha eleitoral, o modo, a todos os títulos admirável, como se realizaram as recentes eleições gerais e o exemplar processo de transição actualmente em curso são disso a prova acabada. Não tenho dúvidas de que a forma sábia, serena, equilibrada, mas também firme e determinada, como Vossa Excelência, ao longo dos últimos oito anos, desempenhou o cargo de Presidente da República, muito contribuiu para este amadurecimento do país.

Neste momento em que o Brasil se apresta a virar uma nova página no seu futuro colectivo, com a eleição de um novo Presidente da República que concita as esperanças de milhões de brasileiros num futuro de maior justiça social e prosperidade, quero aqui reafirmar, com todo o ênfase, que, apesar das dificuldades do momento, partilhamos inteiramente, Senhor Presidente, a sua visão de confiança quanto ao futuro desse grande país que é o Brasil.

Acreditamos que, com o seu amor pela pátria, contagiante alegria, e inesgotável criatividade, o povo brasileiro saberá, em democracia, encontrar o caminho da prosperidade e da justiça, fazendo juz a todo esse enorme potencial que faz do Brasil uma grande nação. E acreditamos que esse caminho se continuará a fazer lado a lado com Portugal.

Senhor Presidente,
Meu querido Amigo

Em sinal de reconhecimento pela sua notável acção, que estou certo se irá prolongar no futuro e da qual temos ainda muito a esperar, é com especial honra e prazer que, em nome do Estado português, lhe presto homenagem, impondo-lhe as insígnias da Grã Cruz da Ordem Militar da Torre e Espada, a mais alta condecoração portuguesa.