Mensagem de Ano Novo

Palácio de Belém
01 de Janeiro de 2003


MENSAGEM DE ANO NOVO

Portuguesas e Portugueses,

O ano de 2002 foi um ano difícil, em que, além do mais, uma conjuntura internacional desfavorável fez desacelerar a economia. Os portugueses têm consciência da delicadeza da situação e sentem-na no seu dia-a-dia. Muitos manifestam inquietação quanto ao futuro. Cresce por vezes o sentimento de apreensão e o de injustiça.

Como encarar então o ano de 2003? Não podemos iludir as questões que nos estão colocadas, nem ignorar que a conjuntura internacional não prenuncia uma retoma económica sólida nos meses mais próximos. Temos por isso que responder de forma mais estruturada às dificuldades que se nos colocam.

No contexto de uma situação financeira difícil, foram postas em prática políticas de emergência destinadas a assegurar a credibilidade do compromisso europeu de Portugal, quanto às metas do défice orçamental. Essas medidas de excepção resultaram de uma emergência, mas não configuram uma política. Impõe-se agora estimular a economia , proceder a um controlo rigoroso e estrutural da despesa do Estado e reforçar com tenacidade, a luta contra a fraude fiscal.

Perante as dificuldades, não nos devemos deixar paralisar ou resignar. Devemos, antes de mais, conhecer sempre com rigor a dimensão dos problemas com que nos debatemos para os enfrentar. Será então que o pessimismo de muitos é ajustado à dimensão das nossas dificuldades? Creio que não. Não é justificado, nem é salutar.

De facto, Portugal não vive uma situação de crise insuperável. Temos grandes dificuldades, sem dúvida. Mas não podemos cultivar uma atitude de pessimismo e muito menos de derrotismo que não corresponde nem às condições do país nem às suas reais potencialidades e capacidades.

Digo-vos, com realismo e verdade, que Portugal tem todas as condições para ultrapassar esta conjuntura adversa. Entretanto, é necessário que o Estado exerça a sua função reguladora, se mostre célere a agir sobre os problemas, que não ceda a pressões corporativas e se paute por critérios de rigor e de justiça social. É decisivo que se combata tenazmente a fraude e a fuga ao fisco e se consolide a consciência de que ninguém está acima da Justiça.

Demos passos significativos nalguns destes domínios. Certos sinais, nomeadamente no combate á fraude e ao crime chamado “de colarinho branco” foram particularmente positivos. Estes casos não devem, no entanto, ser interpretados pelos portugueses como sintomas de uma sociedade minada pela ilegalidade e pela corrupção generalizadas. Incito-vos a interpretá-los antes como prova de que o nosso Estado de Direito funciona e a sua autoridade se exerce. É bom que este esforço seja continuado e intensificado. Em Portugal, ainda há fenómenos de ilicitude e impunidade que não são toleráveis e devem ser eficazmente combatidos. Mas não devemos confundir o exercício sereno, eficaz e rigoroso da Justiça com o sensacionalismo mediático. Devemos reconhecer que aí tem havido abusos que, nalguns casos, põem em causa regras fundamentais do Estado de Direito e não contribuem para que sejamos uma democracia mais madura e mais moderna.

Possuímos condições para ultrapassar sem sobressaltos de maior a conjuntura internacional adversa. Todos temos porém um papel decisivo a desempenhar.

Apelo aos parceiros sociais para que, em diálogo com o Governo, sejam capazes de encontrar formas equilibradas e socialmente justas de aumentar a produtividade nacional. Incito os partidos a procurar uma convergência em torno da revisão do Pacto de Estabilidade. Encorajo o Governo a proceder às reformas necessárias da despesa pública, a intensificar o combate à fraude, à utilização ilícita de fundos de duvidosa proveniência e a outras formas de branqueamento de capitais e de subtracção ao fisco.

De mim, os portugueses podem esperar o rigor de sempre. O Presidente da República não é nem Governo, nem Oposição. Sempre entendi o exercício das minhas funções como uma magistratura de estímulo à boa governação, às boas práticas, ao diálogo entre Órgãos de Soberania, à convergência de esforços nas questões essenciais, à reforma da administração e das Forças Armadas. Sou e serei o Presidente que sempre fui, procurando ser imparcial, isento e rigoroso. A fidelidade ao modo como tenho exercido o meu mandato será, porventura, um dos melhores contributos que posso dar a Portugal num momento de maior dificuldade.


Caros Concidadãos,

O retrato sucinto que fiz da nossa situação presente contém, ao mesmo tempo, um apelo ao esforço e à responsabilização de todos, sem excepção. Só com o trabalho e a determinação de todos podemos vencer as dificuldades.

Neste primeiro dia do ano, quero dizer-vos que tenho consciência de que, para alguns portugueses, esta quadra, que é tradicionalmente de festa, foi vivida com preocupação e mesmo receio do futuro. Esses portugueses, muitas vezes os mais desfavorecidos e os menos preparados para fazer face a situações de carência, têm direito á nossa solidariedade. Eu não os esqueço. Uma comunidade é tanto mais forte e dinâmica socialmente quanto mais solidária e coesa fôr capaz de ser nos momentos difíceis. À frieza impessoal dos números, expressos em metas e indices económicos, correspondem frequentemente casos dramáticos de pessoas que não podem ser esquecidas. A modernização da nossa economia tem de ser feita contra os bloqueios, os atrasos, os desperdícios, a falta de iniciativa, de ambição, de qualidade e de inovação. Mas nunca poderá ser feita de forma desumana e sem consciência social.

Neste momento em que esta mensagem é transmitida, encontro-me no Brasil, na posse do novo Presidente, Inácio Lula da Silva, para, em nome de Portugal, transmitir ao povo brasileiro os votos de felicidades neste novo ciclo que agora se inicia.

Dirijo os meus calorosos votos de Feliz Ano Novo a todos as portuguesas e portugueses, vivam onde viverem. Saúdo também os estrangeiros que trabalham na nossa terra, respeitam as nossas leis e contribuem para o nosso desenvolvimento. Quero ainda dirigir uma viva palavra de solidariedade aos nossos vizinhos e amigos da Galiza, que sofrem os terríveis efeitos de um desastre ecológico que também nos tem ameaçado. Desejo que cada portuguesa e cada português receba esta mensagem, apesar das dificuldades, como um sinal de esperança e confiança no futuro.

Bom Ano para todos!

Bom Ano para Portugal!