Alocução de SEXA PR por ocasião da abertura do Congresso “Portugal e o futuro da Europa”, organizado pelo Instituto de Estudos Estratégicos Internacionais

Fundação Calouste Gulbenkian
07 de Março de 2003


Senhor Director do Instituto de Estudos Estratégicos Internacionais
Minhas Senhoras e Meus Senhores


Foi com todo o gosto que aceitei o convite que me foi dirigido para abrir os trabalhos deste Congresso que encerra um útil ciclo de iniciativas promovidas pelo Instituto de Estudos Estratégicos Internacionais com vista a incentivar o debate nacional sobre o futuro da Europa. Não quero deixar de saudar o trabalho de informação, esclarecimento e reflexão que tais encontros propiciaram, os quais contribuíram certamente para sensibilizar a nossa sociedade civil para o debate europeu. Como tenho afirmado, no presente debate sobre o futuro da Europa joga-se em larga medida o destino de Portugal. Estaremos, pois, a hipotecar o horizonte de desenvolvimento do país se nele não colaborarmos activamente e se não ajudarmos, com as nossas convicções, dúvidas e expectativas, a alargar os caminhos de progresso de uma União Europeia que desejamos mais forte, mais coesa, mais solidária e mais influente. Participar nesta discussão que hoje se processa um pouco por toda a parte na Europa é, assim, discutir também o rumo de Portugal no século XXI.

Por considerar que o projecto europeu atravessa uma fase decisiva de mudança e porque o actual debate reformador constitui uma oportunidade única de os europeus se pronunciarem sobre o que querem e esperam para o seu futuro, também eu me tenho empenhado pessoalmente em promover a discussão de ideias à escala nacional e em suscitá-la sempre que me desloco a outros países europeus ou ainda quando homólogos meus, ou outras personalidades, visitam Portugal. A causa europeia tem estado assim naturalmente no cerne das minhas preocupações, constituindo um dos eixos estruturantes da minha actuação política.

Embora, a meu ver, bastante mais possa ainda ser feito com vista a ampliar o debate, valorizando a importância do que está em jogo e reforçando o consenso nacional em torno do nosso compromisso europeu, muito foi já conseguido. O projecto europeu está agora mais próximo dos portugueses e Portugal mais perto dessa Europa em construção. É bom que assim seja, pois uma cidadania participativa é essencial para a consolidação da democracia europeia. Este é, de resto, um dos objectivos principais do debate em curso.

Foi aliás a consciência de uma nova atitude dos cidadãos europeus, finalmente sujeitos activos do seu destino, que levou à convocação da Convenção, amplo e diversificado foro de representação da sociedade civil europeia. E, ao ser-lhe confiada uma missão de tipo constituinte, pretendeu-se justamente criar as condições necessárias para preparar um vasto plano de reformas da União, na dupla perspectiva do seu alargamento e do seu aprofundamento.

Desde a criação da Comunidade Europeia em 1957, houve quatro alargamentos, todos espaçados no tempo. Em trinta e oito anos, associaram-se aos seis Estados fundadores mais nove países. Foram pois processos lentos, que nunca abrangeram mais de três Estados de cada vez. Em 2004, uma escassa década após o último alargamento, aderirão mais dez membros, estando já previstas mais duas adesões para 2007. São números que falam por si, tornando bem patente a extraordinária aceleração da história europeia. Mas também evidenciam o carácter ímpar deste alargamento, o tremendo desafio que o mesmo constitui, a inevitável pressão de mudança que introduz. Passar de seis para quinze membros em trinta e oito anos, foi um processo gradual de evolução que exigiu certamente adaptações de todos conhecidas; passar de quinze para vinte cinco Estados em dez anos é uma mutação que obrigará a reformas profundas. Não creio que possamos escamotear o “efeito dos números” neste particular porque acarreta uma mudança de escala. Por isso, mais do que em ocasiões anteriores, este alargamento é indissociável do aprofundamento, única via de evitar a diluição do modelo que até hoje nos tem regido.

A ambição de dotar a nova Europa de um projecto de Constituição ou texto constitucional, cuja feitura foi confiada à Convenção, ilustra este propósito de aprofundamento, também ele marcado pela chancela da mutação. Os primeiros trinta anos da construção europeia fizeram-se ao abrigo dos Tratados de Roma, período em que tiveram também lugar os três primeiros alargamentos. O Tratado de Maastricht representou, porém, o ponto de viragem imposto pelo termo da Guerra Fria e dos equilíbrios que dela derivavam. Embora cristalize todas as indecisões e compromissos próprios das épocas de mudança, o Tratado da União Europeia é revolucionário a vários títulos: porque cria a União Económica e Monetária, porque preconiza a União Política, porque introduz a noção de cidadania europeia, porque consagra de forma irreversível uma Política Externa e de Segurança Comum que deveria conduzir a prazo a uma Política de Defesa Europeia, porque traz para a esfera comunitária as questões da “Justiça e dos Assuntos Internos”, mas também porque reforça a coesão económica e social da Comunidade, quer pela criação de novos instrumentos como o Fundo de Coesão, quer pelo seu acolhimento como objectivo orientador em todas as políticas e acções da União.

Passados dez anos e apesar dos seus muitos detractores de então, podemos afirmar que deste Tratado resultou mais Europa e melhor Europa. A União Económica e Monetária tornou-se realidade e o euro é hoje a moeda da esmagadora maioria dos europeus; a cidadania europeia trouxe novos direitos de estabelecimento, de circulação, de permanência e de protecção aos nacionais dos Estados-Membros, mas também lhes conferiu direitos cívicos antes inimagináveis; graças ao reforço da política de coesão, a Europa pôde reduzir as disparidades de desenvolvimento entre as suas regiões, favorecendo a convergência económica de todo o espaço europeu; as questões de interesse comum ligadas à Justiça e aos Assuntos Internos, como a entrada e a saída do espaço comunitário, a política de vistos, a imigração, o combate à criminalidade organizada bem como a necessária colaboração policial e judiciária entre Estados Membros passaram a fazer parte da cooperação desenvolvida no âmbito comunitário, embora, num primeiro tempo, pertencendo exclusivamente à esfera intergovernamental. Quanto à Política Externa e de Segurança Comum, a sua introdução no Tratado de Maastricht correspondeu a um esforço de sistematização da prática de cooperação política e representou um compromisso renovado dos Estados Membros em coordenarem as suas políticas nacionais, em torná-las mais coerentes e em prosseguirem objectivos comuns. Foi um primeiro sinal de esperança para vários sectores da opinião pública, na altura preocupada com a crise no Golfo e o agravamento da situação na Jugoslávia. Mas, após uma década de vigência deste Tratado, tal como modificado em Amesterdão, somos forçados a concluir que os resultados obtidos em matéria de Política Externa e de Segurança Comum ficaram muito aquém das expectativas.

É de resto a esta questão que pretendo dedicar a minha intervenção de hoje.


Meus amigos

Escolhi este tema por várias razões: primeiro, porque a actualidade tem suscitado, junto da opinião pública, sérias dúvidas e legítimas preocupações sobre a capacidade da União ultrapassar neste domínio arreigadas tradições e ambições nacionais; em segundo lugar, porque o aprofundamento da Política Externa e de Segurança Comum constitui um dos pontos fulcrais do actual debate europeu, havendo em discussão no seio da Convenção um conjunto de propostas arrojadas com vista à sua reformulação; em terceiro lugar, porque o próprio exercício de refundação da União Europeia, no sentido da criação de uma Federação de Estados-Nação, que pessoalmente subscrevo, só tem sentido no pressuposto de que as matérias actualmente abrangidas pelo segundo pilar passarão a ser abordadas numa perspectiva mais integrada.

Antes, porém, de me debruçar sobre o momento presente e de fazer algumas breves observações sobre o futuro da Política Externa e de Segurança Europeia, gostaria de evocar rapidamente dois pontos. O primeiro diz respeito à Política Comercial Comum e à Política de Ajuda ao Desenvolvimento. De facto, é de justiça lembrar que a Comunidade Económica Europeia desenvolveu desde a primeira hora uma intensa política externa no âmbito comercial e económico, tendo concluído uma rede importante de acordos com países terceiros com vista à cooperação aduaneira, à cooperação comercial, ou ainda à criação de zonas de comércio livre. Primeira potência comercial do mundo, a União Europeia tem igualmente desempenhado um papel de relevo quer no fortalecimento do sistema de comércio internacional e na sua regulação, designadamente através do diálogo estabelecido com os Estados Unidos no seio da Organização Mundial do Comércio (OMC) quer no seio das instituições financeiras internacionais, contribuindo para o desenvolvimento de políticas mais adequadas às necessidades dos países em vias de desenvolvimento, nomeadamente no campo da educação, da saúde e da luta contra a pobreza. Quanto ao vasto domínio da Cooperação para o Desenvolvimento, não devemos esquecer que a União é o primeiro prestador de ajuda pública, desenvolvendo um vasto quadro de cooperação que visa não só integrar esses países na economia mundial e fomentar o desenvolvimento sustentado como também consolidar a construção de sociedades democráticas, baseadas no Estado de Direito e no respeito pelos Direitos Humanos. São estas áreas de actuação comunitária bem consolidadas, em que os progressos registados são notáveis e significativos, e que, num sentido lato, pertencem ao âmbito da Política Externa Europeia. Não obstante, constituem muitas vezes vertentes injustamente omitidas nas avaliações que amiúde se fazem deste campo de intervenção.

O segundo ponto diz respeito à cooperação na área da Justiça e dos Assuntos Internos, em que algumas das matérias foram entretanto comunitarizadas. Também neste capítulo se registaram progressos consideráveis, designadamente no rescaldo do 11 de Setembro e com o reforço da luta contra o terrorismo, bem como com a intensificação do combate a todas as formas de criminalidade organizada que ocasionaram um significativo incremento da cooperação entre a União Europeia e Estados terceiros, nomeadamente com os Estados Unidos. Considero assim que também estes resultados devem ser contabilizados como êxitos da Política Externa Europeia, não devendo o seu peso ser subestimado na hora dos balanços, a que as épocas de crise, como a actual, são especialmente propícias.

No entanto, não pretendo com esta evocação positiva do desempenho da União na área da sua acção externa iludir-me, nem deixar de constatar o carácter irregular e disperso da sua actuação, a sua insuficiente afirmação e a sua falta de peso como actor na cena internacional. Os desafios da mundialização, as novas ameaças e as crises internacionais que vêm marcando o nosso tempo, têm posto a descoberto extensas lacunas, que não temos sabido colmatar. De resto, o momento que estamos a atravessar é disto pouco jubilosa mas gritante ilustração. Não me parece útil, nem sequer pedagógico, escamotear o facto de a União Europeia atravessar actualmente uma séria crise no que respeita à sua unidade interna e à sua afirmação externa. Também não é necessário, nem porventura desejável, dramatizar esta situação, que de resto não é inédita na história europeia.


Minhas Senhoras e meus Senhores

Persisto em crer, porque acredito na solidez dos laços comunitários e na capacidade dos seus membros em restabelecerem o diálogo e a confiança mútuas, que a União saberá tirar os devidos ensinamentos deste período de dificuldades e aproveitar a oportunidade única que o Tratado Constitucional em preparação representa para lançar as bases de uma União Política aprofundada que, indo ao encontro das expectativas das opiniões públicas, se traduzirá no desenvolvimento de uma Política Externa adaptada aos desafios do nosso tempo e à vontade dos europeus.

No meu entendimento, deveremos ver os recentes insucessos não como uma negação da Europa mas, antes, como a prova flagrante de que só com mais Europa, com o reforço da União Política, com mais Política Externa e de Segurança Comum, com mais Política Europeia de Defesa, nos poderemos afirmar como potência mundial e não apenas como um espaço económico. Só assim conseguiremos uma presença mais activa e autónoma à escala planetária, na salvaguarda dos valores comuns, dos interesses fundamentais e da independência da União, da manutenção da paz e do reforço da estabilidade e da segurança internacionais.
Entendo, aliás, que esta é a questão substantiva fulcral do próximo Tratado Constitucional, se quisermos que marque, como o de Maastricht, uma nova etapa no aprofundamento da construção europeia. A criação de uma verdadeira política estrangeira comum é essencial para a consolidação do projecto de União Política. A meu ver, é indispensável proceder a uma maior integração política europeia, que passa necessariamente pela definição de uma visão estratégica da Europa que dê corpo a uma adequada política externa e a uma política de defesa autónoma.

Não creio decerto que seja hoje possível – ou sequer desejável - pensar na comunitarização da política externa e de defesa. Penso, ao invés, que deveremos estar preparados para nos vermos confrontados, em matéria de Política Externa, com soluções flexíveis tendo em conta o factor diversidade que o alargamento introduz. Reputo, no entanto, imprescindível que sejam desenvolvidas estratégias e programas de acções concretas de política externa comum, bem como, no plano da defesa, programas de política de defesa comum, em cooperação com a NATO, numa linha de leal complementaridade e de úteis sinergias. Este é um ponto, a meu ver prioritário. Sem operacionalidade militar, sem capacidade de projecção autónoma, sem armamentos e equipamentos adequados e harmonizados, sem um sistema de informações próprio, sem orçamentos militares à altura das necessidades, a Europa não terá condições para se afirmar como actor credível da cena internacional.

Neste particular, não quero deixar de referir a importância ímpar das relações transatlânticas. Os Estados Unidos são, por certo, o aliado indispensável da Europa. É, de resto, de saudar o acordo global, finalmente logrado em finais do ano passado, com vista a definir um quadro de arranjos permanentes entre a União Europeia a Aliança Atlântica. Os Estados Unidos são também um parceiro incontornável da cooperação internacional e um factor de estabilidade essencial, no mundo em mudança que é o nosso. No entanto, tal não significa coincidência necessária de todos os pontos de vista, nem partilha total de interesses e objectivos. Há relações de complementaridade que podem e devem ser desenvolvidas por forma a evitar redundâncias e perda de eficácia quando as finalidades prosseguidas sejam coincidentes. Mas, as relações internacionais são dinâmicas, assentam em correlações de forças em contínua recomposição e na defesa de interesses que, ora são concorrentes, ora convergentes, ora divergentes. Nada de mais natural que a Europa e os Estados Unidos nem sempre coincidam nas suas análises e decisões, e que, nas suas relações, consoante as matérias em apreço, exista maior ou menor dissonância. O importante, a meu ver, é que se preservem os valores essenciais que alimentam o relacionamento comum e que tudo se passe no quadro do respeito escrupuloso pelos princípios de legalidade que ambos partilham, no respeito mútuo e na base de um diálogo construtivo e de uma concertação constante.


Meus Amigos

Trairia a minha consciência e furtar-me-ia às minhas responsabilidades se não abordasse aqui a questão do Iraque. Falo-vos num momento especialmente crítico, de grande expectativa, mas também ainda de enorme incerteza quanto ao curso que tomarão as discussões no seio do Conselho de Segurança. A suma gravidade dos acontecimentos que vivemos é propícia a exercícios de futurologia, naturalmente ditados pela ânsia de antecipar um futuro que nos preocupa a todos, não só porque está em causa uma guerra, pondo em risco vidas humanas, mas também porque é a ordem, a estabilidade e segurança internacionais que estão em jogo.

Conhecem, no entanto, a minha posição, várias vezes explicitada sem ambiguidades: cabe ao Conselho de Segurança – e só a ele – a decisão última sobre o modo de fazer cumprir as suas resoluções. Considero, portanto, que o recurso a uma intervenção militar sem o seu mandato será ferida de ilegitimidade e porá em grave risco o ordenamento jurídico elaborado no pós-guerra, nomeadamente por lúcido impulso da então Administração americana. Decerto que se trata de uma construção imperfeita, frágil, mas que vem garantindo a convivência internacional na base do direito afirmado pela sua Carta, que Portugal subscreveu e incorporou na sua ordem constitucional. Por isso, a União Europeia nas posições comuns que adoptou sobre o Iraque, tem sempre insistido para que a questão seja tratada e se mantenha no âmbito do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Por isso, também, temos sempre insistido que a guerra deve ser sempre um último recurso, uma vez esgotados todos os meios pacíficos para obter o propósito da Comunidade Internacional – desarmar o Iraque.

Bem sabemos que o tempo das decisões se aproxima rapidamente e que uma intensa actividade diplomática procura ainda uma solução pacífica, tendo como objectivo o desarme pleno de Bagdad e não, importa recordar, qualquer outra estratégia ou a mudança do seu regime, mesmo que este nos seja odioso e insuportável.
Infelizmente, não obstante as impressionantes mobilizações políticas a favor de um processo que esgote todas as possibilidades de paz, são sobretudo sinais de guerra iminente que se avolumam e nos chegam. Deveremos lamentá-lo pelas perdas humanas que tal eventualidade comportará e porque uma acção militar unilateral, para além dos custos políticos e económicos, produzirá inevitáveis e perigosas feridas no tecido de relacionamentos entre países e culturas, enfraquecerá alianças e favorecerá fissuras nas solidariedades europeias. Por isso surpreende-me a posição de certos sectores da nossa opinião que estigmatizam aqueles que pretendem esgotar todas as vias diplomáticas e, na sua militância belicosa, parecem esquecer que não estamos a jogar com abstracções, mas com vidas e sofrimentos humanos.

Para lá das vicissitudes do presente, por graves que sejam, temos de olhar para o futuro, com lucidez, mas também com esperança e convicção. A presente crise tem representado um enorme teste à capacidade dos Estados Europeus em manterem a sua coesão. Estou, todavia, convicto de que a força do nosso interesse comum, a que se junta o peso da opinião pública, acabará por prevalecer. A presente crise não põe em causa os fundamentos do projecto europeu.


Meus Senhores e Minhas Senhoras

Ninguém ignora que o mundo atravessa uma fase aguda de reordenação, cujo ritmo se acelerou com os acontecimentos de 11 de Setembro, mas que estava já em curso desde a queda do muro de Berlim. O fim da guerra fria e a substituição de um sistema internacional bipolar por um sistema aberto, bem como a emergência e a consolidação de múltiplos actores regionais contraposta à afirmação da hiperpotência americana, a globalização galopante com o seu cortejo de oportunidades mas também de novos riscos, criaram uma situação nova que desafia quer o quadro das relações bilaterais tradicionais entre Estados quer o quadro multilateral das organizações do pós-guerra regulador da vida internacional.

A este respeito, a construção europeia, enquanto processo inovador de integração, representa uma das criações mais promissoras do século XX, constituindo, a meu ver, o melhor antídoto para alguns efeitos negativos da globalização e um elemento equilibrador de um mundo unipolar. Com a próxima adesão dos países da Europa Central e de Leste à União, o continente europeu será reunificado. É uma condição sine qua non para que a Europa possa reforçar a sua presença na cena internacional. Mas não bastará. Precisamos também de uma União mais forte, coesa e unida que não seja apenas uma força federadora do continente europeu, mas que constitua também um fermento da dinâmica multipolar e um agente insubstituível para uma legítima disciplina do processo de mundialização.

Nunca é de mais frisar que pertencer à União Europeia representa muito mais do que ser parte de um Tratado ou participar num forum de cooperação intergovernamental. Nenhum laço bilateral por mais antigo e forte que seja poderá substituir a parceria comunitária. A União Europeia constitui uma comunidade de valores e princípios partilhados, assenta num desígnio comum, na vontade de viver em conjunto, de colectivamente construir um futuro de progresso. Nasceu da determinação de assegurar a paz na Europa e de federar os seus povos. Há pois uma obrigação indelével de proteger a igualdade, a unidade, a solidariedade e a coesão. Se estes princípios forem esquecidos ou adulterados, a Europa renega-se a si própria.

Apesar das dificuldades, dos atritos e tensões que por vezes minam o clima de confiança entre Estados Membros, apesar das hesitações ou dos fracassos, da falta de firmeza e de eficácia em política externa, a Europa tem sabido, no entanto, somar algumas vitórias. Basta pensar no Protocolo de Quioto, na Cimeira sobre o Desenvolvimento Sustentável, no processo de perdão da dívida aos países em vias de desenvolvimento altamente endividados, no Tribunal Penal Internacional ou ainda na luta contra o terrorismo organizado. A nível da Política de Defesa, há também a registar alguns progressos, como a Missão de Polícia da União Europeia na Bósnia ou a futura condução de operações militares quer na Bósnia quer na Antiga República Jugoslava da Macedónia, pela União Europeia.

São pequenos passos na via da afirmação da Europa no mundo, mas são sobretudo sinais de esperança, marcas de que, como português e europeu, me orgulho, porque permitem a Portugal assumir também a sua quota-parte de responsabilidade como participante activo na cena internacional. Pelo meu lado, não tenho dúvidas de que a União Europeia oferece um suplemento de afirmação às soberanias nacionais, mesmo e sobretudo neste domínio sensível das políticas externas. Assim saibamos, com realismo mas com ambição, superar divisões e olhando para longe, prosseguir a caminhada que até agora nos tem trazido paz e progresso.

Desejo-vos bom trabalho.
Muito obrigado a todos.