Discurso de SEXA PR na Sessão de Abertura do XXIV Congresso Português de Cardiologia

Funchal
27 de Abril de 2003


Gostaria, em primeiro lugar, de saudar a organização deste Congresso Português de Cardiologia e todos os participantes no seu vasto programa.

Quero, depois, prestar, mais uma vez, a minha homenagem aos médicos que promovem a saúde dos Portugueses e contribuem para melhorar os níveis e padrões de desenvolvimento humano do nosso País.

Não é sem uma ponta de orgulho e até de emoção que, ao comparar os indicadores, os mais diversos, da morbilidade e da mortalidade referentes às últimas três décadas, constato os avanços tão significativos que entre nós foram conseguidos.

Obtido tão lisongeiro patamar, penso que se torna agora imperioso equacionar os futuros desenvolvimentos na Saúde, em Portugal, para que possamos hierarquizar adequadamente as necessidades, fazer escolhas criteriosas e, com os recursos de que vamos dispor, investir no que é realmente determinante.

No passado, nem sempre fomos rigorosos, e nem sempre atendemos à complexidade dos factores determinantes da Saúde. Teremos privilegiado muitas vezes soluções onerosas que, afinal, não representavam senão uma pequena contribuição para atenuar ou resolver um problema. Entretanto, desvalorizámos outras intervenções, nomeadamente no campo da prevenção, que podem produzir resultados de grande alcance.

A este respeito, não posso deixar de lembrar o trabalho verdadeiramente militante do Professor Fernando de Pádua, utilizando de forma pioneira meios eficazes da comunicação social, promovendo a educação para a saúde e, em especial a prevenção das doenças cardiovasculares, alertando para os erros na alimentação, o abuso do álcool, as consequências do consumo do tabaco ou da falta de exercício físico.

Identificámos, há já longos anos, os principais problemas relativos à eficiência e à qualidade do nosso sistema de saúde - as assimetrias na distribuição dos profissionais, a centralização decisória em áreas administrativas, o crescimento descontrolado das despesas, a utilização excessiva do serviços de urgência, a insatisfação de utilizadores, a insatisfação de profissionais. E também fomos capazes de assinalar caminhos mais ou menos consensuais para os atenuar.

Quando refiro que é importante antecipar, se possível quantificando, os problemas de Saúde nos próximos anos, pretendo claramente afirmar que a essência da política de saúde consistirá em saber como alcançar os objectivos de saúde que achamos desejáveis com os recursos de que vamos dispor.

Tal significa que todas as outras discussões ou querelas, por mais importantes que sejam, devem ser instrumentais relativamente a esta dimensão central. Assim, saber se os hospitais devem manter-se no sector público administrativo do Estado ou constituir-se como sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos é algo que deve ser pensado em função da eficiência e da qualidade dos cuidados que queremos prestar aos cidadãos. Por outro lado, os cuidados de saúde primários poderão ser prestados por entidades públicas ou privadas, singulares ou colectivas em função, primordialmente, do "caderno de encargos" da saúde dos Portugueses.

Penso que esta reflexão é oportuna numa altura em que se sublinha, e bem, a preocupação com a eficiência. Porém, também considero que o discurso sobre a universalidade dos cuidados, a qualidade dos actos dos profissionais e das organizações, a formação profissional, a investigação científica e a inovação tecnológica não pode estar ausente das prioridades actuais.

A governabilidade da Saúde, como de outros sistemas sociais complexos, exige capacidades técnicas e políticas, bem como instrumentos de informação e de conhecimento indispensáveis para que as mudanças se façam de forma a promover a coesão social e a reforçar a confiança e a segurança dos cidadãos na sua relação com o sistema de saúde.

Quando percorro o programa deste Congresso, dou conta que lá estão reflectidas, de uma forma geral mas enquadradas pela complexidade dos vossos saberes, estas minhas preocupações.

Por isso, quero aqui deixar uma mensagem de grande confiança na medicina portuguesa, de muito apreço pelo trabalho desenvolvido pelos médicos cardiologistas e de grande determinação para que, na próxima década, nesta ou noutra sala, se possa sentir a mesma emoção e o mesmo orgulho pelos resultados que então se conseguiram.